A CANTORIA CONTINUA DE PÉ (DE PAREDE) OU COMO FALAR DE LIBERDADE NA VELHA ESTRUTURA DE PODER[1]
Antonio Barbosa Lúcio[2]
Este texto visa refletir sobre o processo de consolidação da Universidade Estadual de Alagoas (UNEAL) como IES pública e de qualidade. Destaca os principais entraves tanto externo como interno que constituíram a história da UNEAL. Buscou-se demonstrar que a política neoliberal para a educação desencadeou desestruturação da Instituição com a ampliação de processos privativos do ensino, ingerência político-administrativa e desconfiguração da dinâmica organizacional da Universidade.
A lógica capitalista de produção não possui limites. Sua força representa a fraqueza da população. Seu instinto devorador é diametralmente oposto a luta de seu povo. Resistir e acatar são posições que não se assemelham. Falar em liberdade na velha estrutura de poder significa colocar em xeque a própria visão de democracia, largamente apregoada na sociedade. Se tivéssemos liberdade, talvez não necessitássemos tanto lembrar a necessidade de sua existência. A história da UNEAL está permeada de avanços e recuos. Sua estrutura de organização reflete a sua própria constituição.
Irei conversar um pouco apenas de um período que conheci e conheço. São reflexões e por vezes digressões sobre momentos importantes de nossa história. A partir de meados da década de 1980, em meio ao processo de redemocratização brasileiro; elaboração de nova constituição; eleições para governadores e, posteriormente para Presidente da República; o impeachment de Collor e a permanência de governos autoritários em Alagoas, os ecos do privatismo econômico e ideológico da sociedade liberal, da visão neoliberalizante do governo Collor a resistência ao ensino privado fazia-se presente no interior alagoano. A lógica organizacional da sociedade capitalista, da própria constituição de 1988 que mesmo ao atribuir ao Estado a obrigação da educação pública e gratuita, também, acena com direito da família de educar, ao mesmo tempo em que insinua que a família capitalista poderia ter suas próprias escolas. Vozes contrárias ressoavam, em Arapiraca, diante a incongruência do abandono estatal. Estas ecoavam de forma a tentar se sobressair. São professores e alunos da então FUNEC (Fundação educacional do Agreste Alagoano), sendo a F.F.P.A. (Faculdade de Formação de Professores de Arapiraca) a única Instituição de Ensino Superior do interior do Estado de Alagoas, que passou a dizer NÃO a lógica privada de ensino.
A UNEAL, em seus 38 anos de existência teve que passar por momentos de crises, de angustias, sofrimentos. Estes se interconectaram com as vozes ressoantes do privatismo vigente. Neste jogo político-ideológico, a fundação mantenedora da UNEAL, FUNEC, jogava todas as suas cartas para a continuidade da F.F.P.A. como instituição privada. As lutas tiveram que acontecer, sob os parâmetros das condições objetivas da época. Mesmo sob a orientação privada, emergia suspiros de democracia eletiva. Escolhiam-se seus diretores entre os professores da Instituição. O jogo político também possuía seus entraves e o poder hegemônico, não necessariamente econômico, determinava às formas, as condutas, a vivência, o funcionamento da Faculdade. A raiz do poder como fantasma rondava seus algozes. A velha estrutura de poder esvaía-se. Em seu lugar, novas formas de conceber a educação. O velho dava lugar ao novo sem, entretanto, sucumbir as raízes que o engendrou. Velhas formas, novas formas, diferentes maneiras de manter a hegemonia. Buscou-se, por vezes, na velha estrutura, o caminho de organização da nova Instituição, agora de caráter público. FUNEC deixara de existir, sem perder os vícios que a alimentou por décadas. Passou a co-existir duas orientações políticas: a primeira, centrada na forma de organização político-administrativa, hierarquicamente controlada por seus políticos de plantão; a segunda, mais voltada para a organização interna. Não é preciso dizer que a primeira venceu tendo suas bases em criaturas por vezes sorrateiras que não viam o Ensino Superior para além da satisfação de seus interesses mais imediatos. Ampliava-se, assim, a política do clientelismo e do insulamento burocrático.
O Estado alagoano e seus lacaios, aos poucos transformavam a “nova” Instituição em um grande cabide de empregos. Neste jogo político, perdeu a comunidade acadêmica; a qualidade de ensino; a organização democrática; o processo eletivo. Internamente, valores antes apregoados e por vezes defendidos por muitos, tenderam a cair no esquecimento e abandono. A ladainha que se expandia, estava voltada para a crítica ao pé de parede. Os destinos da Faculdade estavam entregues, de mão beijada, a novas pessoas, mas velhas práticas. A comunidade acadêmica, não conseguia estender suas visões para além de cochichos. Como deitada eternamente em berço esplêndido, não conheciam outra forma de conceber o ensino superior senão aquela praticada por quase duas décadas onde prevalecia o mandonismo quer de seus antigos gestores quer sob a nova ordem do intervencionismo estatal.
Restaram poucas vozes. Entretanto, seus gritos, acordaram parte da comunidade acadêmica. Enquanto a nova ordem nacional clamava aos defensores do neoliberalismo a obediência cega a alavanca que norteou as novas diretrizes sociais: a centralização dos interesses individuais frente a qualquer perspectiva coletiva. Na recém criada FUNESA ressuscitava forças vulgares que ocultava as entranhas do conservadorismo, do mandonismo, do tradicionalismo tacanho sem rosto e sem alma. Paralelamente, resplandecia a partir das vestes mortuárias do antigo privatismo, o fulgor de forças que faziam política sem abraçar a ignorância generalizada da possível ausência de uma ideologia que, dentre outras coisas, se apresentava como sem ideologias.
No gerenciamento da FUNESA para que não restassem dúvidas do retrocesso político, caras velhas se insurgiram das cinzas. Velhas também eram suas teorias, sua prática administrativa sob a roupagem do moderno, da necessidade de crescimento positivo, da ampliação de cursos e do privatismo disfarçado em taxas. Tudo isso, sem um devido estudo que embasasse tal organização. As forças conservadoras passaram a determinar o destino administrativo sob a égide de um politicismo vulgar, centrado nos interesses de grupos políticos econômicos de uma minoria afoita que possuía como intuito maior, manter a pequenez de seus interesses, mesmo que estes estivessem aquém da importância de uma Instituição que se ampliara para diversas localidades no Estado. Não importava a que custo, a quem beneficiasse. O que estava em jogo era a lógica da sustentação política. A comunidade acadêmica, atônita, deixou que direitos conquistados a duras penas, sob ameaças, intimidações, advertências e pressões fossem sorrateiramente dispersados, revestidos de práticas democratizantes. Estavam postas as condições da lenda do lobo em pele de cordeiro. Dizia-se que era preciso reestruturar a FUNESA, (e hoje, a UNEAL) reorganizá-la para que pudesse caminhar forte. Parecia a lógica da Ditadura apregoando a necessidade de deixar crescer o bolo para repartir depois. Como toda mentira possui pernas curtas, não custou para que os diretores-presidentes, a princípio temporários, se tornassem, não hereditários, pois o jogo político no Estado de Alagoas não permitia tal situação, mas passageiros. Acabaram com a escolha dos representantes legais por seus pares, substituindo por sucessivos gestores. Alguns duravam tão pouco, que quase não se percebia sua presença, se não fossem os estragos que ocasionavam.
Acobertando interesses, estava um exercito de mercenários, ávidos por poder, prontos para assegurar que a mesquinhez de desejos mais tacanhos os elevasse a condição de benfeitor, benevolente, desprovido de desejo pessoal. Todo mercenário, como lembrou bem Maquiavel (2000), em o Príncipe, estaria mais disposto a atender seus negócios do que daqueles que o colocou no poder. Monta-se o mito do diretor-presidente preocupado com a FUNESA. Este com não raríssimas exceções, estava pronto para colocar a Instituição em um pedestal de vidro que de tão frágil, tenderia a quebrar. Instala-se o mito, também, de que apenas por ser um professor da Instituição, estaria em sua defesa. Estes dois mitos custaram caro. Interconectados, estavam prontos para defender a qualquer custo os interesses pessoais, os cargos que lhes foram conferidos. Não importava mais, se estes fossem apenas legitimados por interesses obscuros contrários ao desenvolvimento da Instituição, aos companheiros de profissão e ao próprio desenvolvimento do conhecimento.
Foi preciso que um grupo pequeno é verdade, que na ausência de outro nome apropriado, mas tendo por base denúncias concretas, destituísse o pedestal de vidro, publicizasse suas ações, denunciassem os desmandos existentes na Instituição para que tal situação não continuasse ocorrendo. Este movimento, conhecido como Pró-FUNESA, passou a exigir que o processo democrático fosse retomado com a eleição de coordenadores, diretores de unidades e coordenadores de curso. O Departamento de Assuntos Sociológicos (ASO) dos cursos de História e Geografia, da F.F.P.A foi pioneiro nessa luta, elegendo contra a vontade dos gestores, o coordenador dos cursos. É bem verdade que a grande conquista esteve mesmo no ato de demonstrar que aqueles que eram considerados cordeiros nunca admitiram tal alcunha. Ainda não era percebido que para acabar com a árvore ruim, não poderia apenas cortar suas folhas e galhos. Seria necessário atacar a raiz. Esta, na UNEAL, estava centrada na lógica da privatização, nos absurdos da administração. Tivemos erros e acertos. A própria ampliação dos cursos superiores em diversas unidades, pôde favorecer a resistência, ao mesmo tempo em que, ávidos por poder, a rede de mercenários foi expandida também para as novas unidades.
Novos rumos estavam surgindo. Demonstrou-se que a mesma força que determinou a cobrança para que os concursados de 1994 fossem obrigatoriamente empossados, através de determinação legal, não se sujeitava as regras do mandonismo autoritário. Sofreram muitas perseguições. A professora Josineide Francisco, atualmente lecionando Sociologia no curso de Medicina da UFAL, e na época contratada na FUNESA, foi demitida sem justa causa. Voltou a lecionar, por pressão dos alunos que, literalmente, pararam a Instituição, demonstrando aqueles que ainda achavam que a FUNESA era o quintal de sua casa, que não podiam tanto quanto pensavam. De forma semelhante, alunos eram “convencidos” a abandonar o movimento. Aqueles que resistiam a vestir a pele de cordeiro, também sofriam represálias. Tanto naquela época como atualmente, sempre existiu o exército de reserva da elite abastarda que, mesmo sem os louros, se submetiam a seus interesses acriticamente O movimento Pró-FUNESA, tendo entre suas lideranças o Professor Artur Bispo, atualmente lecionando no curso de Filosofia da UFAL, reativou o sindicato dos professores e, participou ativamente das denúncias. Outros professores, sem desmerecer aos demais (que não foram tantos) também fizeram parte dessa luta, a exemplo dos professores Washington Alves, José Carlos Pessoa. A estrutura do velho sindicato tinha caducado. Mesmo existindo há anos, não correspondia, a contento, os anseios dos professores, justamente por sua funcionalidade restrita e/ou inexistente. Exigia-se concurso público, ensino público, gratuito e de qualidade, 40 horas e dedicação exclusiva, plano de cargos e carreira, além de melhorias voltadas para o movimento estudantil, dentre outras coisas. Em 2002, foi criado em conjunto com professores e alunos, um Movimento de Luta pela FUNESA Pública e de Qualidade culminando com a criação oficial do sindicato da FUNESA (SINDFUNESA). Denunciou-se a condição da FUNESA onde possuía “apenas cerca de 30% dos professores efetivos e mais de 70% dos professores contratados como mão-de-obra barata e rotativa: sem direitos trabalhistas e sem nenhum incentivo a pesquisa e extensão (...). “Com o apoio do ANDES, a nossa luta hoje, se dá pela legitimação do sindicato, concurso público para professores e plano de cargos e carreira. Informes prestados por Amaro Hélio Leite da Silva (ANDES, 2002: s/p)”. Como podemos perceber, a luta é antiga e, ao mesmo tempo, apenas começou.
Em nossas reuniões, sofremos abusos, a ponto de um Diretor-presidente decretar que não era permitido reuniões públicas extra-atividades escolares no interior da FUNESA (seja qual for o entendimento que se tinha). Reativou-se, para tal, um decreto da Ditadura Militar que proibia tais acontecimentos. Fomos chamados de “Virus”, em alusão a um “animalzinho” que destrói sorrateiramente. Temiam-se os coveiros que ajudaram a criar. O capital e seus lacaios não podem determinar de antemão qual o desenrolar de suas ações, mesmo que tudo faça para que tal situação ocorra.
Sentimos que incomodávamos. Nossos anúncios e denúncias estavam surtindo efeitos. Agora podiam se preocupar com a existência de entidades privadas, usufruindo das benesses do poder público com o aval incondicional de seus dirigentes. Percebemos que as conquistas ocorriam. Incomodava o poder público estadual, a ponto de, não irmos até eles, mas, por vezes vinham até nós. Defendíamos que a sede da Instituição é em Arapiraca e que o poder público como gestor, deveria tomar ciência do seu papel.
Estava posta as condições objetivas para que o velho fantasma do autoritarismo fosse suplantado. A FUNESA afundava em denúncias. Os jornais no Estado, já não podiam mais fingir que a Instituição não existia. O autocratismo ruía-se. Estava envolvido na própria teia de aranha que construíra. Seu algoz fora criado por quem supostamente deveria alimentá-lo.
Aqueles que podiam soterrar a incoerência administrativa eram os mesmos que insurgiram da docilidade esperada. Entretanto, cometeram o erro de subestimar o poder estatal. Ainda não estavam preparados para entender que seria necessário observar o passado, aprender com seus erros e acertos, mas jamais alimentá-lo e reproduzi-lo. Era preciso perceber que não bastariam novas formas, com velhos gritos de guerra, clamando para que práticas, pessoas e organizações fossem reativadas sem um devido cuidado sobre como tais situações ocorreriam. Assim, como o velho Marx fala em O 18 de Brumário
A tradição de todas as gerações mortas oprime como um pesadelo o cérebro dos vivos. E justamente quando parecem empenhados em revolucionar-se a si e às coisas, em criar algo que jamais existiu, precisamente nesses períodos de crise revolucionária, os homens conjuram ansiosamente em seu auxilio os espíritos do passado, tomando-lhes emprestado os nomes, os gritos de guerra e as roupagens (MARX, 1974: s/p).
Trazer a luz os fatos e acontecimentos servem para que possamos manejá-los. Urge a necessidade de assimilação de novos caminhos, sem esquecer as velhas práticas de subjugação. Não significa substituir acriticamente nem desprezar seus feitos. Foi realizado apenas aquilo que as condições objetivas propiciaram. Seria necessário avançar.
Passamos por vários momentos impares na Instituição. Atingimos a realização de concurso público, a necessidade de qualificação profissional, o mérito por competência em cada área do conhecimento. Atingimos forças que há 20 anos eram consideradas distantes. Retomamos o direito sagrado de escolha dos dirigentes de forma democrática. Afastamos o fantasma da perseguição por divergência de opinião, mesmo que em um ou outro momento ele teime em ressurgir das cinzas.
A presença de novos professores, a partir de 2004, redimensionou o papel da FUNESA. Cursos foram criados ou ampliados, a pesquisa que antes era restrita, pôde, enfim, ser realizada, senão a contento, devido novos valores institucionais, por vezes aquém dos interesses de professores e alunos, puderam expandir a capacidade de produção do conhecimento. Paralelamente, denúncias de improbidade administrativa eram apresentadas na mídia. A Gazeta de Alagoas divulga, em 11/11/2004, uma manchete sugestiva: “Ex-presidente da Funesa vai ser investigado”. No dia seguinte, em 12/11/2004, outra mais interessante ainda: “Lessa exonera presidente da Funesa por telefone”. Foi preciso apenas que um ex-presidente pudesse ser denunciado, a partir de um relatório da Controladoria Geral do Estado (CGE) para que a velha ordem voltasse a vigorar. A FUNESA passou a fazer parte da mídia em diversas reportagens nem sempre honrosas, a saber: “Universidade em Alagoas tem sete cursos fantasmas (O Globo 12/01/2001); MP analisa denúncias contra Funesa (O jornal, 10//04/2006); irregularidades na Funesa será investigada por novo diretor (O jornal, 23/04/2006); MP ainda não recebeu denúncia formal sobre desvios na Funesa(O Jornal, 05/05/2006); Brito quer investigar denúncias de irregularidades na Funesa(O Jornal, 20/06/2006); Funesa terá que afastar servidores irregulares(O jornal, 15/09/2006); PRT dá prazo para Universidade estadual fazer concurso(PRT, 11/09/2006).
O certo é que ninguém sabe o resultado das denúncias a não ser quem se omitiu em investigar ou publicizar. A FUNESA, até então uma Fundação se transforma em Universidade, dentro da lógica de autonomia relativa apregoada na LDB/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação). Esta conquista, honra a todo professor e aluno que se preocupa com a Instituição. Apresenta possibilidade para ampliação de saberes, de gerência administrativa, de organização política democrática. Agora somos nós, efetivamente, professores, alunos e funcionários que detemos os rumos da Universidade. Não significa dizer que não existe ou existirá ingerência política de cunho conservador para manutenção de interesses mesquinhos. Significa que não cabe, como nunca coube, apenas aos governantes o papel de estabelecer o que a Universidade deve fazer. Nosso papel vai além. Nossa postura exige comprometimento com a causa pública, com os interesses da comunidade acadêmica e a superação das relações de subserviência.
Não adianta termos a alcunha de Universidade se agimos como fôssemos uma faculdade isolada, desprovida de autonomia gerencial e de produção do conhecimento. A nova configuração da UNEAL aponta para rumos até então inimagináveis. Cabe, portanto, o rompimento com o burocratismo institucional e as práticas neoliberalizantes. Estas passam a tratar os cursos superiores como empresas, exigindo produção e produtividade, como se a lógica matemática, numericamente falando, da precisão, também pudesse ser aplicada a produção do conhecimento.
Nossas práticas demonstram a teoria que abraçamos e o embasamento teórico que fundamentamos. A nossa postura educativa aponta para o tipo de Universidade que queremos. Infelizmente, coube a alguns profissionais da educação superior da UNEAL, o papel de ampliar a lógica privatista. Criaram-se cursos superiores lato sensu sem a prerrogativa de público e gratuito. O velho fantasma da privatização que rondava a Instituição por toda a década de 1990, passou a existir como se fosse de carne e osso. Sua concretude está espalhada em várias instâncias. Perdeu-se a perspectiva de ampliação do público sobre o privado e, como conseqüência, em um Estado que apenas os 10% mais ricos possuem 70% das riquezas, como é o caso de Alagoas, aqueles que podem pagar, são os privilegiados. E depois, dizem que defendem a UNEAL.
Neste jogo de empurra empurra a UNEAL foi sendo colocada a escanteio. A UNCISAL (Universidade de Ciências da Saúde de Alagoas), segundo a Tribuna de Alagoas, de 09/03/2006 teria tido, em conjunto com outras categorias reajustes salariais aprovados pela Assembléia Legislativa. Estava posto a criação do Ensino Superior de segunda classe. Este não precisava de melhorias, pois ajudaria a formar, em sua maioria professores, não prioritários nas gestões neoliberais. Nesse sentido, Marx (2001:14), em o Programa de Gotha questiona que a educação na sociedade capitalista, destinada as elites, não pode e não vai ser a mesma que a das classes populares. Já em 2005, em 21/10/2005, a tribuna de Alagoas estampava a seguinte manchete sobre a UNCISAL: “Governo apresenta proposta salarial para a saúde”. Mas, como em todo mundo subdesenvolvido existe outros em maior profundidade. Os antigos professores da UNEAL, que sustentaram a existência da Instituição, mesmo com todos os ventos contrários: excessiva carga horária, impossibilidade real de qualificação profissional, manutenção de 20 horas de trabalho, sem progressão vertical ou horizontal e, sem reajustes salariais como estabelece a Lei, também perderam, inclusive a possibilidade de reivindicar direitos. 16,8 % apenas a partir de 2004. Enquanto a UNCISAL, co-irmã da UNEAL avança, retroagimos. O presente passa a ser a história, longe da concepção discutida acima. O velho passado, aquele dos interesses corporativos, politiqueiros, é a força propulsora do Governo Estadual e de seus correligionários. Professores e alunos, atônitos, esquecem direitos, lutas, liberdade. Voltamos a política do pé de parede. [3] O SINDFUNESA alertava sobre a seguinte situação:
em Assembléia Geral ocorrida no dia 23 de novembro, os professores decidiram por maioria, organizar uma paralisação no início do ano letivo de 2007 caso o governo não atenda a pauta de reivindicação da categoria. A principal reivindicação é o regime de 40 horas para todos. A pauta de reivindicação é composta pelo regime de DE, a reposição salarial de 2005 e 2006, concurso para funcionários e professores e a revisão do PCC para garantir a imediata progressão por titulação. Até agora, o governo não tem feito nenhuma sinalização e nenhum canal de negociação foi concretamente estabelecido, apesar da intermediação da direção da UNEAL (SINDFUNESA, Dez/2006).
O governo que prometeu e não cumpriu, desde 1994, renova em 2005, e também promete em 2008. Assim, como deistas, aceitamos viver de fantasias, esperando que algo venha do céu a terra pronto, acabado, sem revoltas, revoluções. Perdemo-nos em lutas puramente econômicas e, o Estado liberal, sabendo da fraqueza desse tipo de ação sem a conotação política, finge que não existimos. Professores, não sem razão abandonam o barco antes que ele afunde. Já são cerca de 40(quarenta). Não perdemos apenas os professores, mas a credibilidade na Instituição. Quem acredita numa entidade que trata seus pares como desafetos, achocalhando suas atividades, impondo de forma autoritária suas práticas verticalizadas. Sem falso profetismo, as prerrogativas do Banco Mundial para a educação, transformando a Universidade em uma grande e fracassada instituição de ensino de 3º grau com feições de ensino médio sem qualidade, tende a ser o futuro das Universidades em geral e da UNEAL, em particular. Não tendo profissionais devidamente habilitados, cairemos no paradoxo da necessidade da competência sem as ferramentas adequadas. Quando for possível perceber, talvez não exista Universidade pública para defender.
Concluo citando um dos autores importantes para o movimento sindical, Lênin (1989). Em seu texto “sobre as greves” esclarece:
Toda greve acarreta ao operário grande numero de privações, tão terríveis que só se podem comparar com as calamidades da guerra: fome na família, perda do salário, freqüentes detenções, expulsão da cidade em que reside e onde trabalhava. E apesar de todas essas calamidades, os operários desprezam os que se afastam de seus companheiros e entram em conchavos com o patrão.
Antonio Barbosa Lúcio[2]
Este texto visa refletir sobre o processo de consolidação da Universidade Estadual de Alagoas (UNEAL) como IES pública e de qualidade. Destaca os principais entraves tanto externo como interno que constituíram a história da UNEAL. Buscou-se demonstrar que a política neoliberal para a educação desencadeou desestruturação da Instituição com a ampliação de processos privativos do ensino, ingerência político-administrativa e desconfiguração da dinâmica organizacional da Universidade.
A lógica capitalista de produção não possui limites. Sua força representa a fraqueza da população. Seu instinto devorador é diametralmente oposto a luta de seu povo. Resistir e acatar são posições que não se assemelham. Falar em liberdade na velha estrutura de poder significa colocar em xeque a própria visão de democracia, largamente apregoada na sociedade. Se tivéssemos liberdade, talvez não necessitássemos tanto lembrar a necessidade de sua existência. A história da UNEAL está permeada de avanços e recuos. Sua estrutura de organização reflete a sua própria constituição.
Irei conversar um pouco apenas de um período que conheci e conheço. São reflexões e por vezes digressões sobre momentos importantes de nossa história. A partir de meados da década de 1980, em meio ao processo de redemocratização brasileiro; elaboração de nova constituição; eleições para governadores e, posteriormente para Presidente da República; o impeachment de Collor e a permanência de governos autoritários em Alagoas, os ecos do privatismo econômico e ideológico da sociedade liberal, da visão neoliberalizante do governo Collor a resistência ao ensino privado fazia-se presente no interior alagoano. A lógica organizacional da sociedade capitalista, da própria constituição de 1988 que mesmo ao atribuir ao Estado a obrigação da educação pública e gratuita, também, acena com direito da família de educar, ao mesmo tempo em que insinua que a família capitalista poderia ter suas próprias escolas. Vozes contrárias ressoavam, em Arapiraca, diante a incongruência do abandono estatal. Estas ecoavam de forma a tentar se sobressair. São professores e alunos da então FUNEC (Fundação educacional do Agreste Alagoano), sendo a F.F.P.A. (Faculdade de Formação de Professores de Arapiraca) a única Instituição de Ensino Superior do interior do Estado de Alagoas, que passou a dizer NÃO a lógica privada de ensino.
A UNEAL, em seus 38 anos de existência teve que passar por momentos de crises, de angustias, sofrimentos. Estes se interconectaram com as vozes ressoantes do privatismo vigente. Neste jogo político-ideológico, a fundação mantenedora da UNEAL, FUNEC, jogava todas as suas cartas para a continuidade da F.F.P.A. como instituição privada. As lutas tiveram que acontecer, sob os parâmetros das condições objetivas da época. Mesmo sob a orientação privada, emergia suspiros de democracia eletiva. Escolhiam-se seus diretores entre os professores da Instituição. O jogo político também possuía seus entraves e o poder hegemônico, não necessariamente econômico, determinava às formas, as condutas, a vivência, o funcionamento da Faculdade. A raiz do poder como fantasma rondava seus algozes. A velha estrutura de poder esvaía-se. Em seu lugar, novas formas de conceber a educação. O velho dava lugar ao novo sem, entretanto, sucumbir as raízes que o engendrou. Velhas formas, novas formas, diferentes maneiras de manter a hegemonia. Buscou-se, por vezes, na velha estrutura, o caminho de organização da nova Instituição, agora de caráter público. FUNEC deixara de existir, sem perder os vícios que a alimentou por décadas. Passou a co-existir duas orientações políticas: a primeira, centrada na forma de organização político-administrativa, hierarquicamente controlada por seus políticos de plantão; a segunda, mais voltada para a organização interna. Não é preciso dizer que a primeira venceu tendo suas bases em criaturas por vezes sorrateiras que não viam o Ensino Superior para além da satisfação de seus interesses mais imediatos. Ampliava-se, assim, a política do clientelismo e do insulamento burocrático.
O Estado alagoano e seus lacaios, aos poucos transformavam a “nova” Instituição em um grande cabide de empregos. Neste jogo político, perdeu a comunidade acadêmica; a qualidade de ensino; a organização democrática; o processo eletivo. Internamente, valores antes apregoados e por vezes defendidos por muitos, tenderam a cair no esquecimento e abandono. A ladainha que se expandia, estava voltada para a crítica ao pé de parede. Os destinos da Faculdade estavam entregues, de mão beijada, a novas pessoas, mas velhas práticas. A comunidade acadêmica, não conseguia estender suas visões para além de cochichos. Como deitada eternamente em berço esplêndido, não conheciam outra forma de conceber o ensino superior senão aquela praticada por quase duas décadas onde prevalecia o mandonismo quer de seus antigos gestores quer sob a nova ordem do intervencionismo estatal.
Restaram poucas vozes. Entretanto, seus gritos, acordaram parte da comunidade acadêmica. Enquanto a nova ordem nacional clamava aos defensores do neoliberalismo a obediência cega a alavanca que norteou as novas diretrizes sociais: a centralização dos interesses individuais frente a qualquer perspectiva coletiva. Na recém criada FUNESA ressuscitava forças vulgares que ocultava as entranhas do conservadorismo, do mandonismo, do tradicionalismo tacanho sem rosto e sem alma. Paralelamente, resplandecia a partir das vestes mortuárias do antigo privatismo, o fulgor de forças que faziam política sem abraçar a ignorância generalizada da possível ausência de uma ideologia que, dentre outras coisas, se apresentava como sem ideologias.
No gerenciamento da FUNESA para que não restassem dúvidas do retrocesso político, caras velhas se insurgiram das cinzas. Velhas também eram suas teorias, sua prática administrativa sob a roupagem do moderno, da necessidade de crescimento positivo, da ampliação de cursos e do privatismo disfarçado em taxas. Tudo isso, sem um devido estudo que embasasse tal organização. As forças conservadoras passaram a determinar o destino administrativo sob a égide de um politicismo vulgar, centrado nos interesses de grupos políticos econômicos de uma minoria afoita que possuía como intuito maior, manter a pequenez de seus interesses, mesmo que estes estivessem aquém da importância de uma Instituição que se ampliara para diversas localidades no Estado. Não importava a que custo, a quem beneficiasse. O que estava em jogo era a lógica da sustentação política. A comunidade acadêmica, atônita, deixou que direitos conquistados a duras penas, sob ameaças, intimidações, advertências e pressões fossem sorrateiramente dispersados, revestidos de práticas democratizantes. Estavam postas as condições da lenda do lobo em pele de cordeiro. Dizia-se que era preciso reestruturar a FUNESA, (e hoje, a UNEAL) reorganizá-la para que pudesse caminhar forte. Parecia a lógica da Ditadura apregoando a necessidade de deixar crescer o bolo para repartir depois. Como toda mentira possui pernas curtas, não custou para que os diretores-presidentes, a princípio temporários, se tornassem, não hereditários, pois o jogo político no Estado de Alagoas não permitia tal situação, mas passageiros. Acabaram com a escolha dos representantes legais por seus pares, substituindo por sucessivos gestores. Alguns duravam tão pouco, que quase não se percebia sua presença, se não fossem os estragos que ocasionavam.
Acobertando interesses, estava um exercito de mercenários, ávidos por poder, prontos para assegurar que a mesquinhez de desejos mais tacanhos os elevasse a condição de benfeitor, benevolente, desprovido de desejo pessoal. Todo mercenário, como lembrou bem Maquiavel (2000), em o Príncipe, estaria mais disposto a atender seus negócios do que daqueles que o colocou no poder. Monta-se o mito do diretor-presidente preocupado com a FUNESA. Este com não raríssimas exceções, estava pronto para colocar a Instituição em um pedestal de vidro que de tão frágil, tenderia a quebrar. Instala-se o mito, também, de que apenas por ser um professor da Instituição, estaria em sua defesa. Estes dois mitos custaram caro. Interconectados, estavam prontos para defender a qualquer custo os interesses pessoais, os cargos que lhes foram conferidos. Não importava mais, se estes fossem apenas legitimados por interesses obscuros contrários ao desenvolvimento da Instituição, aos companheiros de profissão e ao próprio desenvolvimento do conhecimento.
Foi preciso que um grupo pequeno é verdade, que na ausência de outro nome apropriado, mas tendo por base denúncias concretas, destituísse o pedestal de vidro, publicizasse suas ações, denunciassem os desmandos existentes na Instituição para que tal situação não continuasse ocorrendo. Este movimento, conhecido como Pró-FUNESA, passou a exigir que o processo democrático fosse retomado com a eleição de coordenadores, diretores de unidades e coordenadores de curso. O Departamento de Assuntos Sociológicos (ASO) dos cursos de História e Geografia, da F.F.P.A foi pioneiro nessa luta, elegendo contra a vontade dos gestores, o coordenador dos cursos. É bem verdade que a grande conquista esteve mesmo no ato de demonstrar que aqueles que eram considerados cordeiros nunca admitiram tal alcunha. Ainda não era percebido que para acabar com a árvore ruim, não poderia apenas cortar suas folhas e galhos. Seria necessário atacar a raiz. Esta, na UNEAL, estava centrada na lógica da privatização, nos absurdos da administração. Tivemos erros e acertos. A própria ampliação dos cursos superiores em diversas unidades, pôde favorecer a resistência, ao mesmo tempo em que, ávidos por poder, a rede de mercenários foi expandida também para as novas unidades.
Novos rumos estavam surgindo. Demonstrou-se que a mesma força que determinou a cobrança para que os concursados de 1994 fossem obrigatoriamente empossados, através de determinação legal, não se sujeitava as regras do mandonismo autoritário. Sofreram muitas perseguições. A professora Josineide Francisco, atualmente lecionando Sociologia no curso de Medicina da UFAL, e na época contratada na FUNESA, foi demitida sem justa causa. Voltou a lecionar, por pressão dos alunos que, literalmente, pararam a Instituição, demonstrando aqueles que ainda achavam que a FUNESA era o quintal de sua casa, que não podiam tanto quanto pensavam. De forma semelhante, alunos eram “convencidos” a abandonar o movimento. Aqueles que resistiam a vestir a pele de cordeiro, também sofriam represálias. Tanto naquela época como atualmente, sempre existiu o exército de reserva da elite abastarda que, mesmo sem os louros, se submetiam a seus interesses acriticamente O movimento Pró-FUNESA, tendo entre suas lideranças o Professor Artur Bispo, atualmente lecionando no curso de Filosofia da UFAL, reativou o sindicato dos professores e, participou ativamente das denúncias. Outros professores, sem desmerecer aos demais (que não foram tantos) também fizeram parte dessa luta, a exemplo dos professores Washington Alves, José Carlos Pessoa. A estrutura do velho sindicato tinha caducado. Mesmo existindo há anos, não correspondia, a contento, os anseios dos professores, justamente por sua funcionalidade restrita e/ou inexistente. Exigia-se concurso público, ensino público, gratuito e de qualidade, 40 horas e dedicação exclusiva, plano de cargos e carreira, além de melhorias voltadas para o movimento estudantil, dentre outras coisas. Em 2002, foi criado em conjunto com professores e alunos, um Movimento de Luta pela FUNESA Pública e de Qualidade culminando com a criação oficial do sindicato da FUNESA (SINDFUNESA). Denunciou-se a condição da FUNESA onde possuía “apenas cerca de 30% dos professores efetivos e mais de 70% dos professores contratados como mão-de-obra barata e rotativa: sem direitos trabalhistas e sem nenhum incentivo a pesquisa e extensão (...). “Com o apoio do ANDES, a nossa luta hoje, se dá pela legitimação do sindicato, concurso público para professores e plano de cargos e carreira. Informes prestados por Amaro Hélio Leite da Silva (ANDES, 2002: s/p)”. Como podemos perceber, a luta é antiga e, ao mesmo tempo, apenas começou.
Em nossas reuniões, sofremos abusos, a ponto de um Diretor-presidente decretar que não era permitido reuniões públicas extra-atividades escolares no interior da FUNESA (seja qual for o entendimento que se tinha). Reativou-se, para tal, um decreto da Ditadura Militar que proibia tais acontecimentos. Fomos chamados de “Virus”, em alusão a um “animalzinho” que destrói sorrateiramente. Temiam-se os coveiros que ajudaram a criar. O capital e seus lacaios não podem determinar de antemão qual o desenrolar de suas ações, mesmo que tudo faça para que tal situação ocorra.
Sentimos que incomodávamos. Nossos anúncios e denúncias estavam surtindo efeitos. Agora podiam se preocupar com a existência de entidades privadas, usufruindo das benesses do poder público com o aval incondicional de seus dirigentes. Percebemos que as conquistas ocorriam. Incomodava o poder público estadual, a ponto de, não irmos até eles, mas, por vezes vinham até nós. Defendíamos que a sede da Instituição é em Arapiraca e que o poder público como gestor, deveria tomar ciência do seu papel.
Estava posta as condições objetivas para que o velho fantasma do autoritarismo fosse suplantado. A FUNESA afundava em denúncias. Os jornais no Estado, já não podiam mais fingir que a Instituição não existia. O autocratismo ruía-se. Estava envolvido na própria teia de aranha que construíra. Seu algoz fora criado por quem supostamente deveria alimentá-lo.
Aqueles que podiam soterrar a incoerência administrativa eram os mesmos que insurgiram da docilidade esperada. Entretanto, cometeram o erro de subestimar o poder estatal. Ainda não estavam preparados para entender que seria necessário observar o passado, aprender com seus erros e acertos, mas jamais alimentá-lo e reproduzi-lo. Era preciso perceber que não bastariam novas formas, com velhos gritos de guerra, clamando para que práticas, pessoas e organizações fossem reativadas sem um devido cuidado sobre como tais situações ocorreriam. Assim, como o velho Marx fala em O 18 de Brumário
A tradição de todas as gerações mortas oprime como um pesadelo o cérebro dos vivos. E justamente quando parecem empenhados em revolucionar-se a si e às coisas, em criar algo que jamais existiu, precisamente nesses períodos de crise revolucionária, os homens conjuram ansiosamente em seu auxilio os espíritos do passado, tomando-lhes emprestado os nomes, os gritos de guerra e as roupagens (MARX, 1974: s/p).
Trazer a luz os fatos e acontecimentos servem para que possamos manejá-los. Urge a necessidade de assimilação de novos caminhos, sem esquecer as velhas práticas de subjugação. Não significa substituir acriticamente nem desprezar seus feitos. Foi realizado apenas aquilo que as condições objetivas propiciaram. Seria necessário avançar.
Passamos por vários momentos impares na Instituição. Atingimos a realização de concurso público, a necessidade de qualificação profissional, o mérito por competência em cada área do conhecimento. Atingimos forças que há 20 anos eram consideradas distantes. Retomamos o direito sagrado de escolha dos dirigentes de forma democrática. Afastamos o fantasma da perseguição por divergência de opinião, mesmo que em um ou outro momento ele teime em ressurgir das cinzas.
A presença de novos professores, a partir de 2004, redimensionou o papel da FUNESA. Cursos foram criados ou ampliados, a pesquisa que antes era restrita, pôde, enfim, ser realizada, senão a contento, devido novos valores institucionais, por vezes aquém dos interesses de professores e alunos, puderam expandir a capacidade de produção do conhecimento. Paralelamente, denúncias de improbidade administrativa eram apresentadas na mídia. A Gazeta de Alagoas divulga, em 11/11/2004, uma manchete sugestiva: “Ex-presidente da Funesa vai ser investigado”. No dia seguinte, em 12/11/2004, outra mais interessante ainda: “Lessa exonera presidente da Funesa por telefone”. Foi preciso apenas que um ex-presidente pudesse ser denunciado, a partir de um relatório da Controladoria Geral do Estado (CGE) para que a velha ordem voltasse a vigorar. A FUNESA passou a fazer parte da mídia em diversas reportagens nem sempre honrosas, a saber: “Universidade em Alagoas tem sete cursos fantasmas (O Globo 12/01/2001); MP analisa denúncias contra Funesa (O jornal, 10//04/2006); irregularidades na Funesa será investigada por novo diretor (O jornal, 23/04/2006); MP ainda não recebeu denúncia formal sobre desvios na Funesa(O Jornal, 05/05/2006); Brito quer investigar denúncias de irregularidades na Funesa(O Jornal, 20/06/2006); Funesa terá que afastar servidores irregulares(O jornal, 15/09/2006); PRT dá prazo para Universidade estadual fazer concurso(PRT, 11/09/2006).
O certo é que ninguém sabe o resultado das denúncias a não ser quem se omitiu em investigar ou publicizar. A FUNESA, até então uma Fundação se transforma em Universidade, dentro da lógica de autonomia relativa apregoada na LDB/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação). Esta conquista, honra a todo professor e aluno que se preocupa com a Instituição. Apresenta possibilidade para ampliação de saberes, de gerência administrativa, de organização política democrática. Agora somos nós, efetivamente, professores, alunos e funcionários que detemos os rumos da Universidade. Não significa dizer que não existe ou existirá ingerência política de cunho conservador para manutenção de interesses mesquinhos. Significa que não cabe, como nunca coube, apenas aos governantes o papel de estabelecer o que a Universidade deve fazer. Nosso papel vai além. Nossa postura exige comprometimento com a causa pública, com os interesses da comunidade acadêmica e a superação das relações de subserviência.
Não adianta termos a alcunha de Universidade se agimos como fôssemos uma faculdade isolada, desprovida de autonomia gerencial e de produção do conhecimento. A nova configuração da UNEAL aponta para rumos até então inimagináveis. Cabe, portanto, o rompimento com o burocratismo institucional e as práticas neoliberalizantes. Estas passam a tratar os cursos superiores como empresas, exigindo produção e produtividade, como se a lógica matemática, numericamente falando, da precisão, também pudesse ser aplicada a produção do conhecimento.
Nossas práticas demonstram a teoria que abraçamos e o embasamento teórico que fundamentamos. A nossa postura educativa aponta para o tipo de Universidade que queremos. Infelizmente, coube a alguns profissionais da educação superior da UNEAL, o papel de ampliar a lógica privatista. Criaram-se cursos superiores lato sensu sem a prerrogativa de público e gratuito. O velho fantasma da privatização que rondava a Instituição por toda a década de 1990, passou a existir como se fosse de carne e osso. Sua concretude está espalhada em várias instâncias. Perdeu-se a perspectiva de ampliação do público sobre o privado e, como conseqüência, em um Estado que apenas os 10% mais ricos possuem 70% das riquezas, como é o caso de Alagoas, aqueles que podem pagar, são os privilegiados. E depois, dizem que defendem a UNEAL.
Neste jogo de empurra empurra a UNEAL foi sendo colocada a escanteio. A UNCISAL (Universidade de Ciências da Saúde de Alagoas), segundo a Tribuna de Alagoas, de 09/03/2006 teria tido, em conjunto com outras categorias reajustes salariais aprovados pela Assembléia Legislativa. Estava posto a criação do Ensino Superior de segunda classe. Este não precisava de melhorias, pois ajudaria a formar, em sua maioria professores, não prioritários nas gestões neoliberais. Nesse sentido, Marx (2001:14), em o Programa de Gotha questiona que a educação na sociedade capitalista, destinada as elites, não pode e não vai ser a mesma que a das classes populares. Já em 2005, em 21/10/2005, a tribuna de Alagoas estampava a seguinte manchete sobre a UNCISAL: “Governo apresenta proposta salarial para a saúde”. Mas, como em todo mundo subdesenvolvido existe outros em maior profundidade. Os antigos professores da UNEAL, que sustentaram a existência da Instituição, mesmo com todos os ventos contrários: excessiva carga horária, impossibilidade real de qualificação profissional, manutenção de 20 horas de trabalho, sem progressão vertical ou horizontal e, sem reajustes salariais como estabelece a Lei, também perderam, inclusive a possibilidade de reivindicar direitos. 16,8 % apenas a partir de 2004. Enquanto a UNCISAL, co-irmã da UNEAL avança, retroagimos. O presente passa a ser a história, longe da concepção discutida acima. O velho passado, aquele dos interesses corporativos, politiqueiros, é a força propulsora do Governo Estadual e de seus correligionários. Professores e alunos, atônitos, esquecem direitos, lutas, liberdade. Voltamos a política do pé de parede. [3] O SINDFUNESA alertava sobre a seguinte situação:
em Assembléia Geral ocorrida no dia 23 de novembro, os professores decidiram por maioria, organizar uma paralisação no início do ano letivo de 2007 caso o governo não atenda a pauta de reivindicação da categoria. A principal reivindicação é o regime de 40 horas para todos. A pauta de reivindicação é composta pelo regime de DE, a reposição salarial de 2005 e 2006, concurso para funcionários e professores e a revisão do PCC para garantir a imediata progressão por titulação. Até agora, o governo não tem feito nenhuma sinalização e nenhum canal de negociação foi concretamente estabelecido, apesar da intermediação da direção da UNEAL (SINDFUNESA, Dez/2006).
O governo que prometeu e não cumpriu, desde 1994, renova em 2005, e também promete em 2008. Assim, como deistas, aceitamos viver de fantasias, esperando que algo venha do céu a terra pronto, acabado, sem revoltas, revoluções. Perdemo-nos em lutas puramente econômicas e, o Estado liberal, sabendo da fraqueza desse tipo de ação sem a conotação política, finge que não existimos. Professores, não sem razão abandonam o barco antes que ele afunde. Já são cerca de 40(quarenta). Não perdemos apenas os professores, mas a credibilidade na Instituição. Quem acredita numa entidade que trata seus pares como desafetos, achocalhando suas atividades, impondo de forma autoritária suas práticas verticalizadas. Sem falso profetismo, as prerrogativas do Banco Mundial para a educação, transformando a Universidade em uma grande e fracassada instituição de ensino de 3º grau com feições de ensino médio sem qualidade, tende a ser o futuro das Universidades em geral e da UNEAL, em particular. Não tendo profissionais devidamente habilitados, cairemos no paradoxo da necessidade da competência sem as ferramentas adequadas. Quando for possível perceber, talvez não exista Universidade pública para defender.
Concluo citando um dos autores importantes para o movimento sindical, Lênin (1989). Em seu texto “sobre as greves” esclarece:
Toda greve acarreta ao operário grande numero de privações, tão terríveis que só se podem comparar com as calamidades da guerra: fome na família, perda do salário, freqüentes detenções, expulsão da cidade em que reside e onde trabalhava. E apesar de todas essas calamidades, os operários desprezam os que se afastam de seus companheiros e entram em conchavos com o patrão.
E destaca:
A greve ensina os operários a compreender onde repousa a força dos patrões e onde a dos operários; ensina a pensarem não só em seu patrão e em seus companheiros mais próximos, mas em todos os patrões, em toda a classe capitalista e em toda a classe operária (LÊNIN, 1989: s/p).
As lições apresentadas acima estão completando 119 anos e, o mundo globalizado economicamente, tendeu, também, para globalizar a miséria, a fome e a opressão. Mudar a estrutura de poder requer dos envolvidos maior participação política, continuando de pé, mas longe das paredes do comodismo. “E apesar de todas essas calamidades, os operários desprezam os que se afastam de seus companheiros e entram em conchavos com o patrão”. Apenas fico assustado com tudo que foi explicitado com tamanha submissão. Espero, veementemente, que Lênin tenha razão.
[1] Texto escrito como forma de reflexão sobre alguns momentos da FUNEC/FUNESA/UNEAL 15/07/2008. O título é uma adaptação de trabalhos existentes, mas voltado para a Universidade Estadual de Alagoas.
[2] Antonio Barbosa Lúcio é Professor de Sociologia-UNEAL-CAMPUS
[3] A Assembléia Legislativa aprovou ontem (08/03/2005) projetos que prevêem reajustes nos subsídios de cinco categorias de servidores públicos estaduais. Os projetos foram aprovados por unanimidade entre os deputados. Foram beneficiados servidores das Polícias Militar e Civil, Corpo de Bombeiros, Universidade de Ciências da Saúde de Alagoas (Uncisal) e da área de Saúde. No caso dos servidores dessa área, também foi aprovado um projeto que cria os regimes de trabalho normal, de urgência e de emergência.